terça-feira, 12 de abril de 2011

Lagartixa


Não vou perder tempo explicando o inexplicável, o fato é que tenho medinho de lagartixa. Ela fica lá paralisada na parede e do nada se mexe freneticamente atrás de um mosquito, fora isso, em situações de pergigo se desfaz do rabo. A isso se resume a vida de um animalzinho desses, mas é esse bicho que me dá nos nervos. Se uma lagartixa está no cômodo, eu saio. Eu tenho que vê-la morrendo ou indo embora, caso contrário, não alcanço paz de espírito. Se ela some atrás da estante ou do sofá, já era - angústia total. Antes que você me ache o mais idiota dos homens, quero dizer: eu sei que isso é o calcanhar de Aquiles da minha masculinidade.

Agora, eu não sou resignado com isso não. Sei que é maroto e sempre que vejo tal criatura, me esforço para vencer minhas barreiras psíquicas. Mas o dia em que absolutamente avancei sobre elas e investi toda a energia possível pra estinguir de vez esse medinho ridículo, foi o dia da derrota em que mais me senti subjulgado por ele.

Cheguei na casa do meu pai e não tinha ninguém lá. Subi as escadas e entrei no meu quarto. Larguei a mochila na cama e acendi a luz do quarto. Instantaneamente vi a lagartixa na minha parede, do tamanho de um calango bem alimentado, a uns 50cm do meu armário. Pensei rápido, se ela fosse pra trás do móvel, teria que dormir na sala e isso seria o cúmulo da frouxidão. "É hoje" - pensei, decidido - "É hoje que essa história chega a seu fim".

Corri escada abaixo, peguei uma vassoura e voltei correndo, já me sentindo liberto de meus grilhões interiores. Ao chegar novamente no quarto, ela ainda estava lá, no mesmo lugar, olhando para mim e respirando freneticamente como se prevesse o perigo. Teria que ser um único golpe, se eu errasse o alvo, ela iria para trás do armário e eu poria tudo a perder. Me aproximei vagarosamente já com a arma (vassoura) em punho. Ao alcançar a distância exata, respirei fundo e soltei um Meteóro de Pégasus na pequena monstra! Era o fim do meu medinho? Minha vitória absoluta sobre a besta?

Não. Mal sabia que minha vitória se transformaria na pior derrota. Meu golpe foi tão furioso que a bicha caiu no meu do quarto, partida em duas! Na verdade em três, já que o rabo pulou na sua clássica artimanha de defesa. O rabo mexia loucamente enquanto a parte de cima do corpo, ainda viva, tentava fugir com as duas patas dianteiras e um olhar desesperado. Entre as duas metades, esparramado no chão do meu quarto, havia sangue e, juro, órgãos! Um rico material orgânicao consideravelmente colorido.

Ao ver aquela imagem - putz - fiz a pior careta da minha vida e fui fuzilado pelo sentimento de nojo. Pensei 10 segundos e tomei a decisão mais sábia para aquele momento: saí do quarto e fui ver TV. Fiquei na sala até ter certeza de que voltaria e ela estaria inerte e morta. Assim fiz. Depois de uns 10 minutos, voltei e fiz o serviço do rabecão. Joguei o difunto fora, limpei o chão e tive total clareza: a lagartixa é mais forte que eu.

[Novos textos sempre às terças e sextas]

3 comentários:

Anônimo disse...

putz, isso é um fato pra ser apagado da memória, não para ser divulgado ao mundo.

Anônimo disse...

Depois deste texto te recomendo o livro: O VENDEDOR DE PASSADOS, do José Eduardo Agualusa. Dá uma olhada na capa: http://www.travessa.com.br/O_VENDEDOR_DE_PASSADOS/artigo/a5bd897b-a90c-4365-9752-e4204f42e287 - Se bem que essa tá pequena, procura maior depois. Abraço

Gabriela Bach disse...

Meu pai conta uma história muito engraçada sobre lagartixas também. Ele sempre diz que ele um dia foi dormir e durante o sono, ele sonhou que estava brincando de "pegar passarinhos" na mão. Quando acordou, estava segurando duas lagartixas, uma em cada mão. Hahahaah.

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