
Isso deve ter sido no terceiro ou quarto período, ou seja, já nos conhecíamos havia mais de um ano. Entre uma aula e outra, toda a galera se reuniu no Hall da Faculdade de Comunicação, afim de fazermos algo que somos especialistas em fazer: nada. Ali faríamos nada até dar a hora da próxima aula. Como era uma segunda-feira, comecei o papo mais ou menos assim:
- E aí cara, o que fez de bom no final de semana?
- Nada demais. Fui pra casa dos meus pais em Araruama.
- Sério que você tem casa em Araruama? Minha vó mora lá! Quando era pequeno, vivia em Araruama!
- É mesmo? Eu cresci lá po! Quando eu tinha mais ou menos uns 12 anos que me mudei pro Rio. Fui morar no Cachambi...
- Caraca, que concidência! Eu moro no Cachambi!
- Sério?
- Sério pô! Moro lá desde 1993!
- Eu não moro mais lá não, mas morei durante muito tempo! Morava numa ladeira, perto de um restaurante...
- Garcia Redondo?
- É!
- Eu moro na Garcia Redondo cara!
- Como assim?
- É pô! Eu moro lá! Tu morou aonde?
- Eu morava lá no topo da ladeira, num prédio de tijolinho verde...
- Cara, fala sério!
- Vai dizer que tu mora lá...
- Eu moro lá, maluco!
- Tu mora no MEU prédio?
- Teu prédio? Tu que morou no MEU prédio!
- Morei lá sim, no 402...
- Cara, eu moro no 401!
- Ah que isso cara, tá brincando!
- Eu sei! Que doidera! Tu morou na porta da frente do meu apartamento!
- 402, com a varanda de frente pra rua. Bem em frente àquela casinha branca. Ali mora a vó de um amigo meu...
- Tu conhece o Marcelo?
- Você conhece o Marcelo?
- Conheço! Estudou comigo no Pedro II!
- Ele estudou comigo no Santa Mônica!
- Ah moleque, tu tá me zuando...
Era muita coisa pra minha cabeça. À essa altura, a certeza que eu tinha de que ele tava de sacanagem com a minha cara era igual à certeza que ele tinha que eu tava de sacanagem com a cara dele. Em volta, várias pessoas se divertiam com o diálogo. Eu fui beber uma água, estava exaltado. A segunda metade da conversa tinha sido aos gritos. Estava agitado. Afinal, não é todo dia que se encontra uma alma-gêmea assim..!
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